The Umbrella Academy | Crítica e perguntas para a próxima temporada

Em outubro de 1989, 43 mulheres deram à luz, mesmo não estando grávidas no início do dia. Acreditando que as crianças seriam especiais, um excêntrico milionário consegue adotar sete delas, e as treina para salvar o mundo com a ajuda de uma mulher robô e um chimpanzé falante. Essa é premissa de The Umbrella Academy, a mais recente série de sucesso do Netflix.

A série é baseada nas HQs escritas pelo ex-líder do My Chemical Romance Gerard Way e ilustradas pelo brasileiro Gabriel Bá. Para aumentar o interesse do público, The Umbrella Academy conta no elenco com algumas estrelas como Ellen Page, Mary J. Blige e Tom Hopper.

A premissa instigante, o criador ex-rockeiro e o elenco estelar garantiram o êxito de The Umbrella Academy, que ultrapassou a audiência de Stranger Things e em apenas doze dias se tornou a série mais assistida do serviço de streaming, sendo vista por 30,77 milhões de contas diferentes.

Mas faria a série jus a tanto sucesso?

Clichês, confusão e diversão em The Umbrella Academy

A história da 1ª temporada de The Umbrella Academy engloba o conteúdo do primeiro volume das HQ‘s, “Apocalypse Suite”, e parte do segundo, “Dallas”. Em uma tentativa de manter a agilidade e o ritmo dos comics books, a série abusa de cores, cenas de ação e uma trilha sonora eletrizante.

No promissor 1º episódio “We Only See Each Other at Weddings and Funerals”, há uma sequência de dança excepcional, que representa ao mesmo tempo o retorno dos irmãos às suas lembranças de infância, a individualidade de cada um e as semelhanças entre eles. Esteticamente, a cena também impressiona ao transformar o cenário da mansão Hargreeves em uma grande casa de bonecas.

A música permanece como guia da série durante toda a temporada. Em quase todos os episódios, há uma longa cena de ação associada a uma canção empolgante, dando origem a um eletrizante espetáculo. Destaques para a sequência de luta do 2o episódio, regada a “Don’t Stop Me Now” (Queen), e para a cena do 4º episódio em que Cha Cha (Mary J. Blige) e Hazel (Cameron Britton) destroem um laboratório ao som de “Shingaling” (Tom Swoon).

Se o espetáculo visual contribui para o interesse do público, a previsibilidade do roteiro, repleto de clichês, deixa a desejar. Não há nada de inovador na dinâmica da família ou na personalidade dos irmãos.

Há o líder com um senso ímpar de justiça, o rebelde, a curiosa, o caso perdido, o impulsivo responsável por conduzir a trama e a excluída. A relação atrapalhada entre os assassinos Hazel e Cha Cha também não é nenhuma novidade. Nem mesmo a relação incestuosa entre Allison (Emmy Raver-Lampman) e Luther (Tom Hopper) surpreende em uma era pós Game of Thrones.

A dinâmica entre os irmãos superpoderosos treinados pelo pai para combater o crime em muito se assemelha à Escola para Jovens Superdotados do Professor Xavier, na qual os X-Men aprendiam a se tornarem heróis. Até mesmo o principal (e previsível) plot twist da trama parece inspirado em um filme dos X-Men.

Entretanto, os clichês não são o principal problema da trama. São tantas as questões e premissas apresentadas pela série que os primeiros episódios são passíveis de causar uma grande confusão no espectador. Quem é esse? Já foi apresentado qual é o superpoder dela? Da onde surgiu esse cara? Em que ano se passa isso? Essas são algumas das dúvidas que podem surgir em um público mais distraído.

Mas nem tudo está perdido. Além do espetáculo visual, algumas interpretações contribuem para o sucesso de The Umbrella Academy. Destaques para N#5 (Aidan Gallagher), como um afiado senhor preso no corpo de um adolescente, para Page, que entrega uma Vanya consistente, e para a dupla Hazel (Britton) e Cha Cha (Blige). Apesar de clichê, a química entre os matadores de aluguel é excelente. Divertidos e impulsivos, eles protagonizam as melhores cenas da série.

Mas o grande destaque da série fica com Klaus (Robert Sheehan). Atormentado por seu poder que lhe permite ver os mortos, Klaus recorre às drogas para adormecer as vozes que habitam sua mente. Do seu visual aos seus trejeitos, Klaus parece uma mistura de estrela do rock em decadência e o personagem Jack Sparrow, vivido por Johnny Depp na franquia Piratas do Caribe.

Com uma personalidade irônica, o jovem necromancer encanta por sua ingenuidade e fragilidade. Ao lado de Vanya, é o personagem mais complexo da trama, e seu carisma faz o público torcer por sua sobriedade.

Ao mesmo tempo em que Ellen Page é um dos destaques da série, a escolha de sua escalação como a intérprete de Vanya é a principal razão para a previsibilidade da série. Afinal, por que escolheriam a atriz mais famosa de todo o seriado para encarnar justamente a única da família a viver uma vida ordinária?

 Atenção, pois os próximos tópicos desta crítica contêm spoilers de The Umbrella Academy! Prossiga com cuidado!

Perguntas para a 2ª temporada de The Umbrella Academy

The Umbrella Academy parte de uma ideia tão extraordinária que é impossível não sentir curiosidade para continuar assistindo e assim desvendar os mistérios por trás das gravidezes milagrosas ou da origem dos poderes dos irmãos. A questão é que a série não resolve na temporada os principais problemas que ela nos apresenta.

Vamos a elas.

1. Como o Dr. Hargreeves sabia do apocalipse?

O último episódio de The Umbrella Academy inicia com um jovem Reginald Hargreeves (Colm Feore) sendo convencido por sua mulher a abandoná-la em seu leito de morte e fugir. Antes de cumprir o desejo de sua esposa, Hargreeves toca o violino em uma tentativa de deixar sua companheira feliz. Apesar de não ser revelado necessariamente do quê Hargreeves estaria fugindo, o ar futurista das naves no horizonte e os poderes que emanam do lugar sugerem que eles não estariam na Terra. Assim, seria o Dr. Hargreeves um alienígena?

Na cena seguinte, Sir Reginald Hargreeves aparece chegando nos Estados Unidos. Pelo contexto de imigração nos portos e das vestimentas de época, presume-se que Hargreeves adentrou no solo americano no início do século XX.

Não se sabe precisar a época em que se passa a história principal da série, já que ela possui alguns elementos contemporâneos mesclados a certas precariedades. Há robôs, e a tecnologia é avançada a ponto de permitir a criação de uma prótese ocular, mas não há celulares e todos ainda se informam pela utilização de jornais impressos.

Entretanto, pelas vestimentas, é válido presumir que a série se passa em alguma versão dos dias atuais. Sendo assim, após quase um século, como o Dr. Hargreeves ainda não havia morrido? Sua espécie alienígena envelhece mais devagar?

A presença do violino tanto no universo alienígena de Hargreeves quanto na Terra nos leva a crer que a espécie do cientista ajudou em algum nível a colonizar a Terra. Afinal, quais são as chances de duas espécies isoladas possuírem o mesmo conceito para a criação de um instrumento musical?

Outra teoria possível é que Hargreeves venha do futuro, no qual a evolução da medicina conferiu à espécie humana maior longevidade. O apocalipse experimentado por Hargreeves pode ser o que causou a extinção da vida na Terra. Sendo assim, o cientista viajaria no tempo e retornaria aos EUA em tempo de fundar a Umbrella Academy e prevenir o fim da humanidade.

2. Como as mulheres engravidaram?

Este é um dos principais mistérios de The Umbrella Academy. Como 43 mulheres deram à luz no mesmo dia se nenhuma delas estava grávida quando o dia iniciou?

Este evento é um dos principais empecilhos para a teoria de que o Dr. Hargreeves é apenas um viajante no tempo. Como justificar o tempo de gestação de apenas horas ou a mutação que deu origem às crianças com super-poderes senão pela presença de seres alienígenas?

E por que exatamente 43 mulheres? É um número aleatório ou ele quer dizer alguma coisa?

3. Qual é a origem de Pogo?

Seria possível que The Umbrella Academy se passasse em um universo no qual é comum a existência de chimpanzés falantes? Tudo indica que não.

Em determinada cena, Diego (David Castañeda) afirma que seu pai nunca deixava a androide Grace (Jordan Claire Robbins) sair de casa. Apesar de não falar o mesmo sobre Pogo (Adam Godley), o primata é tão inerente à casa quanto Grace.

Pode-se presumir que o cientista não queria que Grace ou Pogo deixassem a residência porque a existência de ciborgues e primatas falantes poderia chocar a sociedade. Neste caso, Hargreeves teria sido responsável não somente pela criação de Grace, como também pelas alterações genéticas de Pogo.

Essa teoria explicaria como o cientista tinha subterfúgios para fundir o genoma primata ao humano, o que permitiu que ele salvasse a vida de Luther.

4. O que é a Comissão e como eles se encarregam do tempo?

Ao longo da série, é revelado que os vilões Hazel e Cha Cha são peões da Comissão, organização responsável pela ordem na linha temporal que a humanidade deveria seguir. Liderados pela Hadler (“encarregada”, em tradução livre, interpretada por Kate Walsh), a Comissão é o órgão que garante que a humanidade seguirá a linha temporal predestinada a ocorrer.

Entretanto, como a Comissão sabe qual das infinitas linhas temporais é a “correta”? E quem colocou a Comissão encarregada da escolha do destino da humanidade?

E principalmente, considerando que a Comissão também é formada por humanos, por que a organização está tão interessada na extinção da vida na Terra?

Essas são perguntas que apenas as próximas temporadas (ou os quadrinhos) poderão responder. Mas é possível que a Comissão não seja liderada por seres humanos, já que isso justificaria a falta de empatia para com o fim da humanidade.

5. O que aconteceu com os outros 36 bebês nascidos em 01/10/1989?

No início de The Umbrella Academy, o Dr. Hargreeves conseguiu adotar sete dos 43 bebês milagrosos. Considerando que todos os filhos adotadas pelo cientista desenvolveram habilidades especiais, é seguro presumir que as outras 36 crianças também possuíam superpoderes.

Entretanto, onde foram parar os outros 36 bebês? Eles ficaram conhecidos no mundo por combater o crime como as crianças da Umbrella Academy?

O Dr. Hargreeves criou seus filhos com um propósito muito claro desde o início. Mas se uma criança com superpoderes for criada com a crença de que é errado ser diferente e que ela deveria suprimir suas habilidades para melhor se encaixar na sociedade, ela pode acabar crescendo com ressentimentos para com a humanidade.

E como visto em Animais Fantásticos, a marginalização do diferente é uma ótima receita para a criação de um supervilão. Será que a Umbrella Academy enfrentará um de seus pares na próxima temporada?

Apesar de ainda não haver confirmação oficial, há rumores de que a 2ª temporada de The Umbrella Academy já recebeu o sinal verde do Netflix, e que as filmagens teriam início no final do ano, em Toronto. Com tantas perguntas chave a serem respondidas, e considerando o sucesso da primeira temporada, esperamos que esse não seja apenas um boato ouvido por Allison.

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