Capitã Marvel | Feminismo, gaslighting e teorias para Vingadores: Ultimato

No Dia Internacional da Mulher estreou Capitã Marvel, o primeiro filme solo de uma super heroína da Marvel. Após muita polêmica e boicote por boa parte da imprensa, os fãs finalmente puderam assistir ao longa e tirar suas próprias conclusões sobre a obra.

Dirigido e roteirizado por Anna Boden (1ª mulher a co-dirigir um filme da Marvel) e Ryan Fleck, o longa acompanha a história de Carol Denvers (Brie Larson), pilota da Força Aérea americana que sofre um acidente e como consequência perdeu sua memória e adquiriu superpoderes. Enquanto tenta recuperar suas lembranças e controlar seus poderes, Denvers se vê em meio a uma batalha entre duas raças alienígenas, os krees e os skrulls.

Capitã Marvel é um filme de origem diferente de qualquer outro já feito pelo estúdio. Enquanto nos outros filmes solo acompanhamos o desenvolvimento dos personagens até se tornarem super-heróis, em Capitã Marvel os acontecimentos não são apresentados na ordem cronológica.

No início do longa, Denvers é uma guerreira kree conhecida por Veers e já possui super poderes, apesar de não saber sua origem. Sem nenhuma memória, o conhecimento de seu passado é construído por meio de flashbacks ao longo da narrativa. Essa estrutura prende a atenção do público, que tenta desvendar os mistérios por trás de sua origem.

A polêmica em torno de Capitã Marvel teve início quando em uma coletiva de imprensa Larson foi questionada sobre a falta de inclusão no meio de críticos de cinema, e como isso pode influenciar nas resenhas de filmes que tratam de diversidade. Em resposta, a intérprete da super-heroína opinou que:

“[O público] não tem oportunidade de ler críticas desses filmes feitas por pessoas que são o público alvo dessas obras. Eu não preciso que um homem branco quarentão me diga o que não funcionou para ele em Uma Dobra no Tempo. Esse filme não foi feito para ele. Eu quero saber o que esse filme significou para mulheres negras, mestiças, para adolescentes que são mestiços.”

Devido a este comentário, boa parte dos críticos que se encaixavam no perfil descrito por Larson decidiu fazer um boicote ao Capitã Marvel, sob o pretexto de que sua protagonista havia publicamente concedido uma entrevista informando que o longa não era para este público. A guerra fora das telas foi iniciada.

Para encorajar o boicote, diversos críticos avaliaram negativamente o longa no Rotten Tomatoes e no IMDb, antes mesmo de sua estreia. Como consequência, o Rotten Tomatoes mudou sua política e passou a liberar a opção de avaliar um filme apenas após sua estreia.

No Brasil, um post sobre como o feminismo poderia causar o primeiro fracasso da Marvel nos cinemas viralizou nas redes sociais. Apesar da previsão, o filme bateu recordes e arrecadou $455 milhões de dólares ao redor do mundo em seu fim de semana de estreia. É a sétima maior estreia da história, e 2ª maior da Marvel, perdendo apenas para Vingadores: Guerra Infinita.

Afinal, depois de toda a polêmica envolvendo o longa, Capitã Marvel vale o ingresso?

 

Atenção, pois os próximos tópicos desta crítica contêm spoilers de Capitã Marvel

 

As referências aos anos 90 e os furos de roteiro em Capitã Marvel

Carol Denvers e Nick Fury no elevador em Capitã Marvel

 

Primeiramente, vale dizer que como obra isolada, excluindo-se sua relevância social, Capitã Marvel é um bom filme. Nem ruim, nem excelente.

Entretanto, o longa é bastante divertido e nostálgico para aqueles que cresceram nos anos 90. São muitas as referências à década. Elas estão presentes nas camisetas do Guns’n’Roses e nos óculos estilo aviador de Carol Denvers, na trilha sonora excepcional que vai de TLC a Hole, e na famigerada locadora Blockbuster.

Além disso, há referências a obras que faziam sucesso nos anos 90. Em determinada cena no espaço, fica evidente a homenagem a Star Wars. Mas acima de tudo, Capitã Marvel reverencia os longas do gênero buddy cop, populares na década.

Os filmes com a fórmula buddy cop são aqueles em que duas pessoas (normalmente policiais ou investigadores) de personalidades distintas são obrigados a trabalhar juntos para resolver algum crime. No desenvolvimento da narrativa, esses indivíduos que inicialmente não se gostavam aprendem um com o outro. São exemplos desse gênero Máquina Mortífera (1992), MIB: Homens de Preto (1997), e A Hora do Rush (1998).

A relação entre Nick Fury (Samuel L. Jackson) e Carol Denvers segue essa fórmula. Curiosamente, é Fury, visto como “durão” em todo o Universo Cinematográfico Marvel, que ocupa o espaço de policial sensível e ingênuo, enquanto Denvers é a investigadora severa e destemida, fazendo assim o contraponto da dupla.

Apesar do saudosismo que garante boa parte da diversão, o roteiro de Capitã Marvel deixa a desejar. Se por exemplo a mudança na personalidade de Fury pode ser justificada pelo decorrer do tempo, algo que carece de explicação é a normalidade com a qual o agente e os demais terráqueos encaram a existência de vida alienígena.

Além disso, não há um desenvolvimento no arco da protagonista. Carol é mostrada desde o início como uma garota forte e valente, e termina o filme da mesma forma. Se Denvers apanha e se levanta, é porque ela sempre o fez.

Não é revelado como sua personalidade é moldada, e o filme não explica de onde ela tirou forças para quebrar os padrões sociais e se tornar uma piloto em um ambiente dominado por homens. Dessa forma, enxergamos a protagonista de forma mais superficial.

O que confere maior complexidade à personagem são os flashbacks que demonstram a interação entre Carol, sua melhor amiga Maria (Lashana Lynch) e a filha dela Monica (Akira Akbar). Estas memórias põem Carol em contato com sua humanidade novamente.

O roteiro não é falho apenas no background da Capitã Marvel. No início do filme, Veers é integrante da Starforce, equipe de elite do exército kree. Encabeçada por Yoon-Rogg (Jude Law), a Starforce possui diversos integrantes, que ficaram completamente apagados no filme. A falta de contextualização dos personagens os tornam descartáveis e irrelevantes. Isso porque se não empatizamos com eles, não tememos por suas vidas.

Apesar das falhas de roteiro, o Capitã Marvel continua sendo uma boa fonte de entretenimento, principalmente pelas mensagens deixadas pelo filme.

 

O feminismo e empoderamento em Capitã Marvel

Maria e Carol Denvers em treinamento em Capitã Marvel

 

A presença de mulheres por trás das câmeras reflete na maneira como as personagens femininas são retratadas. Uma outra mulher sabe quando uma roupa é desconfortável demais para lutar. Ou o quão irritante é a necessidade de aprovação masculina para legitimar suas escolhas.

Capitã Marvel contou com co-diretora feminina. Além disso, teve a história criada por cinco pessoas, das quais quatro mulheres. Seu roteiro foi escrito por duas mulheres e um homem. Geneva Robertson-Dworet, uma de suas escritoras, também foi responsável pela repaginação de Lara Croft em um ícone feminista em Tomb Raider: A Origem (2018).

A equipe majoritariamente feminina teve um impacto extremamente positivo no filme. Ao contrário do ocorrido com Diana Prince (Gal Gadot) em alguns trechos de Mulher Maravilha, Carol Denvers nunca é hiperssexualizada.

Até mesmo nas cenas mais descontraídas, enquanto canta no karaokê em um bar com sua melhor amiga, Denvers não é objetificada. Seus trajes de luta, diferente das vestimentas da heroína da DC, são confortáveis e apropriados para o embate em vez de cumprirem a função de atrair olhares do público masculino.

 

Carol Denvers com trajes da heroína em Capitã Marvel

 

Outro ganho considerável do longa é que Denvers não possui par romântico. Por este motivo, assim como ocorrido com a Lara Croft de Alicia Vikander, houve diversas especulações quanto à orientação sexual da Capitã Marvel. Principalmente porque o laço mais forte que Carol possui, e que é essencial para o resgate de sua humanidade, é com sua melhor amiga Maria Rambeau (Lashana Lynch). Seria a heroína lésbica?

O fato de Carol ter um forte vínculo com sua melhor amiga e não possuir par romântico no longa não são indícios de homossexualidade. Esses fatores indicam apenas que ela é um ser humano afortunado que possui amizades verdadeiras e que é livre para se relacionar com quem quiser, quando quiser. É um desserviço às mulheres a ideia de que a única razão para uma garota manter amizade com um homem sem nutrir interesse romântico por ele é a certeza de sua homossexualidade.

Além desses fatores, há cenas em que a abordagem do empoderamento feminino são mais explícitas. Dentre elas, destaca-se aquela em que um scanner alienígena, ao analisar o índice de periculosidade do humano do sexo masculino, chega ao veredito de que ele é “inofensivo”.

Mas a cena mais emblemática ocorre no final do último ato, quando após ter sido completamente dominado, Yon-Rogg provoca a Capitã Marvel para que ela controle suas emoções e poderes e engaje em uma luta justa com ele, de igual para igual. No que Carol, completamente liberta da tóxica influência que o líder kree exercia nela, responde: “Eu não tenho que provar nada para você.”

Este é o principal discurso feminista de Capitã Marvel. Carol compreendeu que não precisava suprimir seus poderes para agradar Yon-Rogg. Mais que isso, ela entendeu também que não havia absolutamente nada de errado em lutar de forma passional.

Normalmente, agir conforme as emoções é uma característica atrelada ao sexo feminino. E ser emotiva usualmente também é visto como sinônimo de fraqueza. Qual mulher nunca foi chamada de “louca”, ou sofreu gaslighting de um homem que atribuiu alguma emoção sua à TPM?

Em contrapartida, ser forte, vigoroso e controlador são aspectos associados à virilidade masculina.

Devido a este fato, muitas mulheres sofrem um processo de “masculinização” para serem bem-sucedidas na vida profissional. Afinal, aprenderam desde cedo que suas características femininas denotam fragilidade e vulnerabilidade.

Apesar desta crença, estudos que apontam que a liderança feminina é superior à masculina em diversos aspectos, tais como iniciativa e comunicação, habilidade de inovar, apoio aos seus subordinados e gerenciamento de metas. Mulheres tendem a ser mais emotivas, e por isso podem ser mais empáticas e terem uma comunicação mais aberta com seus subordinados.

Lutar como uma garota então não é uma fraqueza. É uma virtude.

Além disso, ao se livrar das amarras de Yon-Rogg e abraçar todo o seu poder, Carol Denvers nos relembra o quão abusivo é um relacionamento em que a mulher sente que deve suprimir seu potencial para não ferir a frágil masculinidade alheia.

São inúmeros os casos de homens que são intimidados por mulheres bem-sucedidas. Para evitar problemas no relacionamento, elas escondem aumentos ou perdem oportunidades profissionais.

A masculinidade frágil advém da noção machista de que o homem deve ser o grande provedor da família, enquanto a mulher cuida da casa e da prole. Se o principal pilar da virilidade está na capacidade de sustentar a casa, como fica a identidade do homem que tem menos sucesso profissional que sua esposa?

Para mudar este quadro, é essencial a reconstrução da noção de masculinidade doutrinada por nossa sociedade. Ser homem é muito mais que prover pela família, e não há vergonha nenhuma em apoiar a parceira para que ela atinja todo o seu potencial.

 

O que esperar de Vingadores: Ultimato

Tony Stark em uma nave espacial em Vingadores: Ultimato

 

Uma das cenas pós créditos de Vingadores: Guerra Infinita já fazia a conexão para o longa Capitã Marvel. Antes de ser dizimado por Thanos (Josh Brolin), Fury utilizou o pager dado por Denvers para sinalizar à heroína que a Terra estava em perigo.

A primeira cena pós crédito de Capitã Marvel mostra a consequência da ação de Fury. Capitão América (Chris Evans) e Viúva Negra (Scarlett Johansson) lamentam a destruição causada por Thanos, enquanto Bruce Banner (Mark Ruffalo) e Máquina de Combate (Don Cheadle) tentam desvendar quem estaria por trás do símbolo misterioso enviado pelo agente da S.H.I.E.L.D.

Nesse contexto, chega a Capitã Marvel, e pergunta de forma inquisitiva onde está Fury.

A contextualização dessa cena pós crédito em um momento em que os heróis ainda estão abalados pela perda de seus amigos pode quebrar a expectativa de alguns fãs de que a heroína apareceria em Vingadores: Ultimato apenas na parte final do longa.

O posicionamento da Capitã Marvel no início de Vingadores: Ultimato também dá pistas de que as ameaças encaradas pelos heróis no longa serão ainda maiores que “apenas” Thanos. E a presença de Ronan, o Acusador (Lee Pace) ao final de Capitã Marvel podem indicar que este é um dos vilões que Carol Denvers enfrentará no quarto filme dos Vingadores.

Esta afirmação soa incorreta, já que Ronan já morreu na franquia Guardiões da Galáxia. Mas a seguir, explicaremos melhor como a Capitã Marvel poderia enfrentar alguém que já morreu.

Apesar de já ter se mostrado extremamente poderoso, Thanos sozinho poderia não ser páreo para o grupo de heróis sobreviventes acrescido de uma das heroínas mais poderosas de toda a Marvel. Afinal, além de lhe conceder DNA kree, a explosão da nave de Mar-Vell (Annette Bening) também conferiu a Denvers poderes advindos do Tesseract, uma das Joias do Infinito.

Considerando a revelação em Capitã Marvel de que Mar-Vell descobriu a tecnologia da velocidade da luz por meio da manipulação da energia do Tesseract, uma das teorias possíveis para Vingadores: Ultimato é que a heroína utilize dessa tecnologia para voltar no tempo e lutar contra Thanos antes do gigante dizimar 50% da população mundial.

Essa hipótese também possibilitaria o embate entre Ronan, o Acusador e Carol Denvers.

Outra possibilidade para a utilidade de Capitã Marvel em Vingadores: Ultimato é que, por conseguir facilmente voar para o espaço, a heroína poderia resgatar Tony Stark (Robert Downey Jr.) e Nebula (Karen Gillan) de seus trágicos e iminentes destinos.

Ao final de Vingadores: Guerra Infinita, Stark e Nebula foram únicos heróis sobreviventes no planeta Titan do extermínio causado por Thanos. E diferente de Thor (Chris Hemsworth) que possui limitações em sua capacidade de voar, Capitã Marvel demonstrou ao final de seu filme de origem que ela consegue fazer viagens espaciais sem a necessidade de trajes especiais ou naves.

 

São muitas as teorias, mas o que é incontestável é que a heroína terá um papel essencial na derrota de Thanos e no retorno da situação da Terra ao seu status quo. Felizmente, a quase um mês da estreia Vingadores: Ultimato, falta pouco para descobrirmos o quão alto, longe e rápido pode chegar a heroína mais poderosa da Marvel.

Quais são suas teorias para Vingadores: Ultimato? Deixe nos comentários!

 

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Boo Mesquita

Geek de carteirinha e cinéfila, ama assistir a filmes e séries, ir a shows, ler livros e jogar, sejam games no ps4 ou boards. Quando não está escrevendo, pode ser vista fazendo pole dance, comendo fora ou brincando com cachorrinhos. Me siga no Instagram!

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