Death Stranding | Hideo Kojima e o poder das conexões

O tão esperado Death Stranding foi lançado pela Kojima Productions e Sony Interactive Entertainment no final do ano de 2019 para o console PlayStation 4. O lançamento representou um momento histórico para a indústria, não só pela antecipação do público (afinal, o jogo foi anunciado oficialmente na E3 de 2016!) e todo o hype criado com a participação do ator Norman Reedus (o Daryl de The Walkind Dead), mas também por se tratar do primeiro jogo de Hideo Kojima desde a dissolução de sua empresa como subsidiária da Konami, em 2015.

Hideo Kojima é provavelmente o mais famoso diretor de videogames, ainda que talvez não seja o melhor. Afinal, podemos citar outros que se saíram muito melhor ou foram mais premiados que Kojima na história dos games, principalmente se analisarmos a última década.

Hidetaka Miyazaki, por exemplo, criador de Dark Souls e Bloodborne, foi responsável por criar todo um gênero (ou pelo menos um subgênero) no mundo dos games, e vem influenciando muito mais as novas obras do que Kojima. God of War, penúltimo vencedor da maior premiação do The Game Awards, para citar um exemplo, possui influências bem claras das obras de Hidetaka Miyazaki. E o último vencedor, Sekiro, inclusive foi codirigido pelo mesmo.

O que fez sua fama de “o lendário Hideo Kojima”, no entanto, provavelmente passa pelas inspirações cinematográficas na forma em como ele guia a narrativa de seus jogos. E mais do que isso, pelo marketing que faz em cima de seu nome, colocando “A Kojima game” na capa de muitos de seus títulos, o que no mundo dos games infelizmente não é o comum. E assim, o diretor criou uma marca.

 

norman reedus e hideo kojima

 

Mas isso tudo não tira a verdadeira genialidade de Hideo Kojima em contar suas histórias, sempre elevando o ritmo de suas narrativas de forma crescente e com muita criatividade ao criar seus personagens e universos. Metal Gear, que para olhos ignorantes pode parecer se tratar apenas de um jogo sobre soldados e robôs gigantes, na verdade se mostrou ser uma trama gigantesca, tratando sobre existencialismo, poder, maldade, esperança, organizações secretas e ideologias malignas. Temas que Hideo Kojima sempre gostou de abordar em suas criações.

Em Death Stranding, entretanto, Kojima mostrou que sua mente sabe lidar com algo ainda mais abrangente: a ciência e os sentimentos. Não que estes temas não estivessem presentes em Metal Gear, mas a ação e clichês necessários em um jogo de espião não se encontram mais em Death Stranding.

Diferente do personagem Snake, Sam (Norman Reedus) não é um herói de ação. Muito ao contrário disso, Sam é apenas um entregador. E sua jornada de descobrimento, sobre si mesmo e sobre os outros personagens que circundam essa obra tão inteligente e emotiva, fazem de Death Stranding um clássico instantâneo de sua época.

 

norman reedus com bebe em death stranding

 

Death Stranding é uma obra que trata de pessoas, e de seus sentimentos. Todos e cada um dos personagens nessa história possuem um passado que influencia estritamente suas perspectivas sobre o futuro.

Mama (Margaret Qualley), por exemplo, foi uma mãe que estava em trabalho de parto quando o tal acidente aconteceu. Ao invés de trazer a vida ao mundo, ela trouxe a morte, e isso mudou totalmente sua maneira de lidar com as pessoas, sempre se escondendo e vivendo sozinha de todos. No entanto, ainda nutrindo a esperança de um mundo conectado, ela mantinha o contato com a UCA (sigla em inglês para “Cidades Unidas da América”), pois acreditava que poderia ajudar o mundo a ser um lugar melhor.

Cada um dos personagens de Death Stranding levam seus nomes ao pé da letra, seus conceitos são extremamente criativos e todos fazem parte de forma natural naquele mundo. Ainda que não demos spoilers, temos certeza que você nem imagina o que “Fragile” (Léa Seydoux), “Deadman” (Guillermo Del Toro) e “Die-Hardman” (Tommie Earl Jenkins) têm haver com seus nomes.

 

personagens de death stranding

 

E é exatamente as conexões que faz com cada um desses personagens que moldam em quem Sam Porter Bridges se transformará. Sam, que começa a obra como um homem solitário e que evita o máximo qualquer tipo de contato sentimental com outras pessoas, ao decorrer da narrativa forma laços de amizade e de família , compreendendo e participando da história de cada uma das pessoas que se conecta.

Diferente de seu personagem “Daryl”, na série The Walking Dead, por onde o ator ficou mais conhecido, o novo personagem de Norman Reedus possibilitou que ele apresentasse mais camadas para sua interpretação. Sam passa por diversos sentimentos conflitantes ao longo da jornada, e Norman Reedus conseguiu transmitir isso muito bem. O seu melhor papel, que provavelmente não será lembrado em futuras premiações, mas que sem dúvidas nunca saíra das lembranças de quem esteve com ele nessa busca de conexões que é o mundo de Death Stranding.

Mundo este, que foi minuciosamente bem conceituado e produzido, com diversas inspirações na cultura Egípcia, Grega e até mesmo Nórdica, passando por inúmeras evidências científicas de fato já pesquisadas e catalogadas.

Mas é claro que a fantasia não fica de lado. Se em Metal Gear, Kojima já gostava de criar uma mitologia fantástica e densa, em Death Stranding ele teve ainda mais liberdade em criar o que bem entendesse. E assim, desenvolveu um universo absurdamente abrangente, que brinca até mesmo com a pré-história e com toda a história moderna da humanidade, desde a primeira guerra, e passando até mesmo pela guerra do Vietnã.

 

o bebe de death stranding

 

No jogo, Kojima usa muito o conceito da quiralidade, que na química orgânica é aplicado para definir um objeto que não pode ser sobreposto à sua imagem especular (espelho). Ou seja, um quiral. Já um objeto aquiral, pode ter sua imagem especular pode ser sobreposta à sua imagem original.

Em Death Stranding, o mundo dos mortos e dos vivos são entrepostos nesse conceito, o que faz a mitologia criada por Hideo Kojima ser extremamente complexa, abrindo diversos caminhos de interpretá-la, dentro da ciência e do espiritualismo.

Os personagens utilizam diversas vezes os termos “Ka” e “Ha”, sendo estes termos egípcios para “Corpo” e “espírito”. Toda a pesquisa e dedicação ficam claros na obra, demonstrando o amor dos envolvidos no projeto.

Death Stranding, mais do que um jogo de entregas de mercadorias, é uma obra sobre conexões. Sobre seus impactos, e sobre como elas moldam o mundo ao nosso redor. E mais do que isso, sobre como nossas conexões nos moldam.

 

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Dereck Yan

Estudante de direito na universidade UNIG, escritor ainda não publicado, mestre de RPG e dono do canal Bunker Contemplativo.

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