The Witcher | Quais as diferenças do Geralt de Rívia na série, livros e games?
Com o lançamento da série The Witcher no final do ano passado pelo Netflix, o caçador de monstros Geralt de Rívia acabou invadindo mais uma mídia de entretenimento: a televisão. Antes confinado aos livros e games, hoje temos mais uma versão do Bruxo andando por aí e aprontando das suas.
Talvez a expressão “mais uma versão” possa soar estranha, mas no caso de Geralt é isto que temos, três variantes de um mesmo personagem, cada qual com suas características únicas. Quem acompanha seus heróis ou personagens nos livros, quadrinhos ou cinema sabe que quando uma obra é adaptada, mudanças são necessárias. Entretanto, no caso de Geralt, temos um cenário bem mais incomum do que de costume.
Esta diferença se dá ao caminho tortuoso e incomum que a obra percorreu, desde o seu primeiro livro, de 1993, até a estreia do seriado The Witcher, em 2019. Fatores como um autor excêntrico e o sucesso dos jogos atribularam bastante a vida de Geralt, e é nesta existência confusa (porém interessante) que pretendemos nos aprofundar um pouco hoje.
The Witcher no Netflix: O ápice de popularidade do personagem
Se existe algo inegável, é o sucesso de The Witcher no Netflix. Mesmo recebendo uma crítica morna pelos especialistas, o público abraçou a ideia. E segundo um estudo publicado pelo próprio Netflix, as histórias do Bruxo só perdem para Stranger Things, um feito no mínimo incrível, ultrapassando outras séries com mais renome e tempo de exibição.
O que muita gente não sabe é que a decisão de lançar um seriado do universo The Witcher foi uma aposta bem arriscada, mesmo o material base sendo vasto e muito bom. Isso se dá porque mesmo com a alta qualidade dos livros do autor Polonês Andrzej Sapkowski, a base de fãs de Geralt vem, em sua maioria, das suas aventuras nos games.
Experiências com adaptações de games para o cinema e TV é um assunto conturbado, para dizer o mínimo, com poucas exceções no decorrer da história. E mesmo que os jogos sejam importantes, hoje não é mais possível ignorar os acontecimentos dos livros, que acabaram ganhando muita popularidade após Geralt ter entrado para o rol de grandes personagens do meio eletrônico através do seu jogo The Witcher 3 Wild Hunt.
O Netflix tinha um problema nas mãos: como agradar a todos? Talvez pareça simples, mas o fato é que na sua transição para os games, o universo do personagem sofreu tantas alterações que em dados momentos, uma coisa anula a outra. Qual escolher?
No seriado de The Witcher temos um Bruxo bonitão, com um sorriso estilo Hollywood, de poucas palavras e belos olhos amarelos. Sua armadura é preta e ele carrega uma bela espada de prata nas costas. Não podemos negar que Henry Cavill nos ofereceu um belo Geralt nas telas, mas e o fato de que nos livros ele é magro? Ou que seus olhos são escuros? E nos jogos, que ele carrega duas espadas nas costas e jamais fala com seu cavalo, coisa que realiza com frequência nos livros?
A maneira com o Bruxo lida com os acontecimentos de sua vida é bem diferente nas três mídias que participa. Portanto, para que possamos entendê-lo em toda sua magnitude, falar um pouco de sua trajetória pode ajudar bastante.
O Geralt nos livros: desagradável, feio e mal-humorado
Em 1993, na Polônia, nasce “Wiedźmin”, que significa “Bruxo” em português. As histórias narravam as aventuras de um homem que foi retirado de sua família cedo e que passou por mutações violentas e aprendizados profundos para caçar monstros, seres mágicos que rondavam o mundo e ameaçavam as pessoas. Em função deste treinamento, Geralt se transformou em um ser humano de aparência inquietante, sem pigmentação em sua pele ou cabelo, com uma voz desagradável e um corpo delgado e deselegante.
As histórias se passam em um continente onde os elfos já foram a raça predominante, mas hoje são marginalizados pelos humanos. Com referências celtas, gaélicas e irlandesas o autor criou um universo medieval bem diferente do convencional, nada parecido com o de Tolkien, por exemplo. As primeiras aventuras foram publicadas como contos (que depois foram compilados nos livros O Último Desejo e Espada do Destino) para depois se transformarem em um longo épico, contado através de vários livros.
Nestas aventuras, Geralt não é um cara tão bonito ou tão legal como mostrado no seriado. Ele é rechaçado por onde passa, mesmo salvando a vida de inocentes (um de seus apelidos, “Carniceiro de Blaviken”, vem de uma dessas experiência) ou caçando as bestas que ceifam vidas sem ressentimentos. Ele fala bastante, principalmente com seu cavalo e diz muitas vezes que pode ou não pode fazer algo em função do seu “Código de Bruxo”.
O interessante é que, mesmo com a qualidade inegável das obras, tudo que Sapkowski criou ficou confinado à sua região de origem, passando despercebida pelo resto do mundo. O Bruxo só conseguiu sair de lá em 2007, com o lançamento do seu primeiro game. E é neste momento que tudo fica mais interessante (e confuso).
O Geralt nos Games: um personagem diferente de suas origens
Se hoje temos Henry Cavill andando por aí com cabelos grisalhos e uma espada nas costas, temos que agradecer a uma empresa chamada CD Projekt Red. Estes caras, lá em meados de 2005, queriam fazer um jogo sobre a série de livros que eles mais gostavam, que, por acaso seria The Witcher. O interessante é que até o nome que conhecemos é obra desses camaradas, visto que, se dependesse do autor, o nome seria “The Hexer”.
Com bastante força de vontade e não muito dinheiro, a CD Projekt foi até o autor comprar os direitos da obra e, em um dos piores negócios da história, Sapkowski vendeu tudo por míseros US$ 9.500,00, não querendo participação nos royalties e exigindo o pagamento à vista. Isto aconteceu porque o autor não é muito fã de games e disse que na época não via futuro no projeto. Ele deve ter ficado bem triste quando viu que o orçamento inicial do The Witcher 3 foi de US$ 81 milhões, tanto que foi na justiça, querendo entrar na festa.
O primeiro jogo teve um orçamento modesto e um desenvolvimento atribulado, pois a empresa não tinha um motor gráfico próprio e acabou optando por usar um da Bioware, a empresa que criou games como Knights of the Old Republic (do universo de Star Wars) e Mass Effect. Outro problema era que muito do que era contado nos livros era impraticável nos jogos, fazendo com que Geralt e os outros personagens sofressem diversas mudanças para uma melhor adaptação.
Seus olhos não eram mais negros, como no livro, e outras “liberdades” foram tomadas, como seu aspecto físico e a maneira com que ele lidava com as outras pessoas. Afinal, ninguém ia querer controlar um personagem feio, ou ouvir durante mais de vinte horas uma voz desagradável.
O jogo foi lançado em 2007 com relativo sucesso, o que deu a CD Projekt animo para continuar a franquia e mostrou a editoras que talvez o personagem tivesse aderência. Sendo assim, no mesmo ano que o game saiu, seus livros começaram a ser publicados em inglês.
Com cada versão nova de seus jogos, Geralt ficava mais bonito, com uma voz mais marcante e cada vez mais distante do Geralt dos livros. Segundo a própria empresa que criou os jogos, uma das maiores influências no personagem foi o Batman, então é possível perceber para que direção eles estavam indo. Foi com o lançamento do segundo jogo em 2011 que finalmente o Bruxo aportou em terras brasileiras, através da editora Martins Fontes, o que começa a mostrar que os jogos estavam caindo no gosto do público.
O terceiro jogo dispensa apresentações. Tendo um orçamento milionário, e uma das melhores produções da última década, The Witcher 3: Wild Hunt foi um sucesso instantâneo, definindo a atual geração de consoles. Foi este jogo que acabou por inserir a maioria dos personagens do universo, como Jaskier (ou Dandelion, como é seu nome em inglês), Yennefer e Ciri. O game recebeu diversos prêmios, incluindo vários “jogo do ano” e é seguro afirmar que qualquer pessoa que tenha um PC ou console já tenha testado o jogo ao menos uma vez. Infelizmente, foi nessa época também que, sofrendo alteração após alteração para que fosse aceito pelo seu público, que Geralt acabou se transformando em outra pessoa.
O círculo se fecha: como produzir a série de um personagem com tantas versões?
O Netflix tinha uma missão (bem difícil): criar uma obra que agradasse três públicos, os que gostam do esquisitão dos livros, os que gostam do herói dos jogos, e as pessoas que nunca viram nada da obra mas amam seriados e filmes. E a resposta a este dilema foi a mesma que a CD Projekt Red deu quando criou seu jogo: inventar mais um Geralt, que atendesse a todas estas exigências.
Para os fãs do game, eles logo de cara já usaram a Ciri como gancho principal para todo o enredo (assemelhando-se ao terceiro e mais conhecido game da franquia), modelou uma armadura bem
semelhante a do jogo e fez o Geralt ser mais (talvez até demais) bonitão, de olhos amarelos e com pinta de Batman. Ah, e colocaram a Yennefer também, logo de cara (ela demora para aparecer na obra escrita).
Para os fãs dos livros eles mantiveram nosso bruxo com uma espada só, e construíram uma sequência de episódios semelhante aos dois primeiros livros: uma história de fundo puxa aventuras menores que são contadas individualmente (os dois primeiros livros são coletâneas de contos que seguem esse mote). Logo de cara foram adaptados uma boa quantidade de contos na série, onde podemos destacar:
– “No Limite do Possível”, onde Geralt Encontra o Três Gralhas;
– “A Espada do Destino”, onde Ciri acaba na floresta das Dríades (no seriado esse evento não conta com a presença de Geralt e no livro sim);
– “Uma Questão de Preço”, onde é retratado a união de Pavetta, em Cintra;
– “O Bruxo”, onde é retratada a luta contra a Estrige.
Fora isto, vários elementos dos livros foram usados para temperar a história, como elementos do conto “O Mal Menor” entre outros.
Tendo em vista o peso medonho da tarefa, podemos dizer que o Netflix conseguiu, não de forma perfeita, agradar todo mundo. Para o terceiro público (o do seriado) ela deixou os valores de produção, uma ótima fotografia e outros elementos usados em séries ambientadas em cenários semelhantes.
O resultado final contou com altos e baixos, mas, no geral, foi excelente. É possível notar o medo do Netflix em investir demais na obra e isto aparece em efeitos especiais duvidosos e outros pequenos detalhes que, apesar de relevantes, não prejudicam a série. A boa notícia é que agora que ficou provado que Geralt faz sucesso, o Netflix já prometeu várias temporadas e até uma animação. Provavelmente veremos valores de produção ainda maiores e um grande empenho nas novas empreitadas do Bruxo.
E você? Qual versão do nosso caçador de monstros mais famoso da atualidade gosta mais? Está ansioso para o que o futuro reserva para Geralt? Curtiu a série? Deixe sua resposta nos comentários!
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