Elite | A série está à altura de La Casa de Papel?

O Netflix parece ter encontrado uma maneira de manter os órfãos de La Casa de Papel entretidos enquanto não estreia a 3ª temporada da série. O serviço de streaming juntou os intérpretes de Denver (Jaime Lorente), Rio (Miguel Herrán) e Alison Parker (María Pedraza) e lançou Elite, a mais nova série adolescente de seu catálogo.

E o resultado do projeto paralelo acabou sendo tão bom quanto ou superior ao original.

A história e a fórmula de Elite são bem batidas. Nadia (Mina El Hammani), Samuel (Itzan Escamilla) e Christian (Miguel Herrán) são estudantes “plebeus” que foram agraciados por bolsas para estudarem em um dos colégios mais exclusivos de toda a Espanha. O choque entre as diferentes realidades é um prato cheio para gerar intrigas entre os alunos, que acabam transcendendo o ambiente das salas de aula.

Acrescentou-se à trama uma história de assassinato como garantia de que o público permaneceria vidrado na obra.

Elite é visivelmente inspirada em Gossip Girl, Riverdale, How to Get Away With Murder e outras obras de sucesso entre os adolescentes. Seu conteúdo, portanto, está longe de ser original. Mas Elite não se contenta apenas em reproduzir uma fórmula. Ela a aprimora, a atualiza, e como resultado temos uma série viciante que trata de temas atuais sem perder o tom crítico e educativo.

No entanto, não se engane. É uma série voltada ao público adolescente, de modo que pode ser considerada uma boa opção de entretenimento se comparada a outras obras do mesmo gênero. Portanto, não espere discussões profundas. Elite não é este tipo de série.

Também é importante ressaltar que os hormônios dos personagens de Elite estão tão à flor da pele quanto de qualquer outro adolescente. Não há puritanismos: a maior parte das cenas da série envolve festas regadas a sexo, álcool e drogas, ou (preferencialmente) os três.

Nos próximos tópicos desta resenha trataremos dos temas mais relevantes e atuais abordados pela série.

 

HIV

Marina olha apreensiva em Elte

 

Fazia tempo que uma obra voltada ao público adolescente tratava sobre o tema. Em Elite, a protagonista Marina (María Pedraza) é filha de um importante empreiteiro envolvido em escândalos de desvio de dinheiro. Ela e seu irmão Guzmán (Miguel Bernardeau) são os alunos mais populares do colégio.

No entanto, Marina esconde do resto da classe que ela é portadora do vírus HIV. No passado, ela foi infectada por Pablo, um ex-namorado que era bolsista no colégio. Em um acesso de raiva, Guzmán e seus amigos agridem Pablo por ter passado o vírus para a jovem. Pablo quase morre, e a família de Marina faz um acordo faraônico para se livrar de um processo criminal. Como represália, a escola proíbe bolsistas durante alguns anos.

Elite faz uma boa crítica à maneira com a qual a soropositividade ainda é retratada em nossa sociedade. Ao revelar que tem AIDS, Marina não sofre qualquer tipo de preconceito entre seus colegas de classe. Afinal, ela tem acesso aos melhores tratamentos e seu vírus não é detectável, de modo que ela não pode infectar ninguém.

Por outro lado, Pablo não tem a mesma sorte. A série mostra a todo instante que a família e os amigos de Marina culpam seu ex-namorado pela doença da jovem, como se ele tivesse a infectado de propósito. A família de Marina chega ao absurdo de sugerir que o HIV é uma doença relacionada aos pobres.

O preconceito então não estaria na soropositividade, mas na maneira pela qual os portadores do vírus de classes menos abastadas são considerados os culpados pela disseminação da doença, enquanto os ricos são as vítimas dela.

 

Homossexualidade, bissexualidade e poliamor

 

Seguindo os passos de Com Amor, Simon, Elite trata seus personagens LGBT com mais cuidado. Quando Ander (Arón Piper) decide agir e ter sua primeira experiência com Omar (Omar Ayuso), ele ainda está muito confuso e acaba não conseguindo se entregar totalmente. Mas não é por isso que ele se reprime ou age de forma agressiva com Omar para afirmar sua masculinidade. Ele apenas se afasta um pouco, para tentar entender tudo o que está sentindo.

Todos ao redor de Omar e Ander parecem lidar muito bem com o fato de que os jovens são gays. Ao descobrir o envolvimento dos jovens, a mãe de Ander expôs que ele não precisava esconder sua homossexualidade. Os amigos dos garotos ficaram inclusive um pouco ofendidos com o fato de que eles acharam que tinham que esconder sua orientação sexual.

Destaque para a reação de Guzmán, melhor amigo de Ander, e que é o atleta mais popular do colégio. Como a homossexualidade no âmbito esportivo ainda é um tabu, foi revigorante ver o rei do colégio abraçar seu amigo e dizer palavras de apoio.

Os adultos que demonstraram sentir preconceito foram justamente as figuras paternas de Ander e Omar, que, de formas diferentes, representam o pensamento retrógrado em Elite. Enquanto o pai de Omar não aceita a homossexualidade de seu filho por ser muçulmano ortodoxo, o pai de Ander finge não se importar com a orientação sexual de seu filho, desde que ele continue cumprindo o que é esperado dele.

Mas Ander e Omar não formam o único casal LGBT de Elite. A união entre duas mulheres também foi representada na série por meio das mães de Polo (Álvaro Rico), influentes publicitárias que fazem parte do exclusivo círculo social da trama.

 

Christian e Polo se entreolham com Carla ao fundo em Elite

 

Já a bissexualidade foi explorada com os personagens de Polo e Christian. Inicialmente voyeur, Polo não hesitou em ceder aos seus impulsos e explorar sua sexualidade com Christian.

Christian, por outro lado, poderia apresentar maior preconceito, já que é o arquétipo do malandro e amigo de criminosos. Surpreendentemente, ele encara sua experiência com naturalidade, já que em vez de escondê-la, conversa com Carla (Ester Expósito) sobre ela. Apesar de a motivação de Christian para sua experiência homossexual ser questionável, é certo que não houve preconceito por parte do rapaz.

Outro assunto abordado em Elite concernente à sexualidade é o poliamor. O tema já foi recentemente objeto de outros conteúdos originais do serviço de streaming, como Eu, Tu e Ela e Easy. No entanto, um diferencial de Elite é que, ao contrário das obras mencionadas anteriormente, o trisal é composto por dois homens e uma mulher.

É inegável que a relação está longe de ser saudável. Polo e Carla usam Christian sem parecer se importarem com os sentimentos do rapaz. Por sua vez, Christian tira proveito do relacionamento com os dois, aceitando os presentes, convites para festas e propostas de trabalho como modelo. Ainda que se questione a real motivação do relacionamento tóxico existente entre os três, é certo que eles formaram um trisal, mesmo que por um breve período de tempo.

 

Preconceito

Nadia conversa com Marina em Elite

 

O preconceito não foi abordado em Elite somente relacionado à homofobia. O seriado tratou da xenofobia por meio de Nadia e Omar, filhos de muçulmanos ortodoxos. Ao chegar no colégio, Nadia é proibida de exercer sua religião por meio do uso do seu hijab. Além disso, em uma conversa com Samuel, Omar explica por que passou a traficar drogas. Samuel e Omar distribuíram currículos para trabalhar como ajudantes de cozinha. No entanto, apenas Samuel foi empregado por um bar. Na visão de Omar, ele foi recusado por ser palestino. E em um mundo pós 11 de setembro, provavelmente ele tinha razão.

O preconceito também está presente no trato entre as diferentes classes sociais. Ao mesmo tempo em que os estudantes ricos diminuem os mais pobres e os tratam de forma inferior, estes por sua vez tratam a elite por meio de seus esteriótipos. Assim, enquanto Guzmán trata os bolsistas de forma inferior, Nano e Christian acham que os “filhinhos de papai” são estúpidos e alienados.

Mas a faceta mais interessante do preconceito retratado em Elite está naquele exercido pelas minorias. Nadia é julgada no colégio por ser muçulmana e bolsista. No entanto, ela própria não está desprovida de preconceitos. Ao descobrir que Marina tem AIDS, Nadia passa a ignorá-la. Mesmo sofrendo discriminação, a jovem não consegue empatizar com a dor de Marina.

Essa reflexão só reforça a ideia de que o preconceito é algo irracional. Por causa dele, tratamos o outro de forma diferente com a qual esperamos ser tratados. Falta-nos compaixão.

 

Empoderamento

Carla, Marin e Lucrécia posam para foto em Elite

 

Mesmo que não trate do assunto de forma explícita, Elite é uma série repleta de mulheres empoderadas.

Assim como em La Casa de Papel, o delegado designado para o assassinato de Marina é uma mulher, apesar de a área policial ser dominada por homens. Duas das mulheres mais influentes da Espanha são lésbicas. O diretor da escola mais exclusiva do país é uma mulher. E também são do sexo feminino os três melhores alunos do colégio.

Mas o maior exemplo de empoderamento da série reside em suas protagonistas. Aparentemente submissa a seu pai, Nadia demonstra personalidade forte ao criar coragem para conquistar seu espaço ao mesmo tempo em que ajuda seu irmão.

Marina é tratada por sua família como frágil e vítima de Pablo, de quem contraiu o HIV. No entanto, ela os lembra a todo instante que não foi enganada por seu ex-namorado. Ela não se vitimiza, e toma responsabilidade por todos os seus atos.

Carla é talvez a mulher mais empoderada da série, no sentido cru da palavra. Polo acredita estar no controle do relacionamento entre Carla e Christian, mas não tarda a descobrirmos que Carla manipula os dois rapazes como bem entende, sem se preocupar com seus sentimentos ou com as consequências.

O que as duas protagonistas têm em comum é que nenhuma delas seria considerada como uma pessoa boa a julgar exclusivamente por suas ações em seus relacionamentos. Marina ilude Samuel e namora o rapaz enquanto tem um caso com seu irmão, e Carla usa Christian e Polo a seu bel-prazer. A diferença entre elas é que enquanto Marina sente remorso por suas escolhas, Carla não se importa com mais ninguém além dela mesma.

Retratar as mulheres como manipuladoras ou seres falhos não é uma coisa ruim. Os personagens femininos têm tanto direito de errar quanto os masculinos. Apresentar as mulheres sempre como perfeitas seria reforçar o estigma do sexo frágil que tanto lutamos para desconstruir.

 

Apesar de trazer temas já batidos em outras obras teen, como Riverdale e Gossip Girl, Elite inovou tanto na abordagem que foi um sucesso instantâneo do serviço de streaming. Como resultado do buzz gerado, semanas após sua estreia a série já teve confirmada sua segunda temporada, que irá ao ar em 2019. Será que nela descobrirão a verdade sobre o assassinato de Marina?

Quais são suas expectativas para a segunda temporada? Não se esqueça de deixar sua opinião nos comentários! XOXO, Gossip Girl.

 

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Boo Mesquita

Geek de carteirinha e cinéfila, ama assistir a filmes e séries, ir a shows, ler livros e jogar, sejam games no ps4 ou boards. Quando não está escrevendo, pode ser vista fazendo pole dance, comendo fora ou brincando com cachorrinhos. Me siga no Instagram!

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