Sou Um Assassino: Em Liberdade (Netflix) | Assassinos merecem uma segunda chance?

Existem muitas séries de true crime hoje em dia que abordam a temática das confissões falsas feitas por pessoas inocentes. Mas e quando o assassino realmente confessa seu crime e cumpre a pena imposta pelo Estado? O que acontece depois? Essa é a temática de Sou Um Assassino: Em Liberdade, novo documentário da Netflix.

A série documental é dividida em três partes, e foca mais na reabilitação do assassino após o cumprimento da pena que na investigação do crime em si. Em abril de 1990 Dale Wayne Sigler assaltou uma lanchonete da rede Subway em Arlington, no Estado do Texas, EUA. Após pegar  U$ 400 dólares da caixa registradora, Dale seguiu o atendente John William Zeltner, que buscava mais dinheiro nos fundos da loja, e atirou seis vezes em suas costas. Zeltner morreu na hora. Dale Sigler confessou o crime, e em 1991 foi condenado à morte por injeção letal.

No entanto, em 1993 o Texas alterou suas leis referentes à seleção do júri, e os advogados de Dale conseguiram recorrer e reverter sua condenação para a prisão perpétua. Assim, após 3 anos no corredor da morte, a vida de Dale havia sido poupada. Por conta disso, Dale refere a si próprio no documentário como “um milagre vivo”.

De acordo com a legislação do Texas, após 30 anos encarcerado o prisioneiro tem direito a aplicar para requerer o benefício da liberdade condicional. E foi assim que, após 30 anos recluso, Sigler poderia finalmente colocar os pés para fora da prisão.

Mas não era tão simples assim. Para ter direito à condicional, Dale precisava de um endereço fixo no Texas, e sua mãe, por problemas de saúde, havia se mudado para a Califórnia.

 

Os próximos tópicos dessa análise contêm spoilers de Sou Um Assassino: Em Liberdade! Prossiga com cuidado!

 

A segunda chance de Dale em Sou Um Assassino: Em Liberdade

Dale e Mamma Carole em casa em Sou Um Assassino: Em Liberdade

 

É fácil chegar à conclusão de que a ressocialização dos presos é um importante instrumento para evitar a reincidência e proliferação de novos crimes. Mas dentre aqueles que acreditam na ressocialização, quem realmente estaria disposto a dar uma segunda chance para um assassino confesso?

Você contrataria um assassino em sua empresa? Se contratar um criminoso já é uma tarefa difícil, acolhê-lo em sua casa parece algo impensável. Mas foi exatamente isso que Carole Whitworth fez.

Carole Whitworth conheceu Dale quando visitava seu enteado na prisão. Percebendo que Dale era muito solitário, aceitou se corresponder com ele, e eles acabaram criando laços de amizade. Dale, conhecido na prisão pelo apelido de “Grande Urso” devido à sua ternura, acabou apelidando Carole de “Mamma Carole” (Mamãe Carole, em alusão à sua própria mãe).

Carole expõe em Sou Um Assassino: Em Liberdade sobre como pediu ajuda a Deus quando Dale perguntou se poderia morar com ela para cumprir a exigência de sua liberdade condicional. Em um exemplo ímpar de bondade (e para muitos, ingenuidade), Carole decidiu acreditar na mudança de Dale e ofereceu sua casa para que eles morassem juntos até que o ex-prisioneiro conseguisse dinheiro para arcar com suas próprias despesas.

Nem todo herói usa capa.

 

O passado de Dale em Sou Um Assassino: Em Liberdade

Dale preso em Sou Um Assassino Em Liberdade

 

Desde a sua prisão, Dale sempre assumiu a culpa pelo assassinato. Ele afirmava que na época do crime estava morando na rua, e era viciado em drogas. O assalto teria sido uma forma de conseguir dinheiro para sustentar seu vício.

Conforme é mostrado em Sou Um Assassino: Em Liberdade, a infância de Dale foi conturbada. Após perder o emprego, seu pai se tornou agressivo e abusivo com ele, sua mãe e seus demais irmãos. Ele costumava presenciar cenas de violência doméstica, e se lembra de sua mãe machucada, com os olhos roxos e os lábios cortados.

Aos dez anos, ele afirma que foi abusado por um membro de sua família. Ele tentou conversar com sua mãe sobre isso, mas de acordo com ele, ela não soube lidar com a situação. Aos doze, seus pais se separaram. Dale e seus irmãos passaram a morar com sua mãe, e se mudaram de Estado por diversas vezes.

Quando era adolescente, Dale se tornou usuário de drogas e fugiu de casa para morar nas ruas do Texas. Ele sobrevivia cometendo delitos e roubos. Quando tinha 22 anos, acabou cometendo o crime que tirou a vida de Zeltner.

Na verdade, a escolha daquele Subway não foi uma coincidência. Dale conhecia Zeltner, e por esse motivo Zeltner não desconfiou de nada quando viu Dale entrando na loja.

Para a família de Zeltner, também entrevistada no documentário, tratava-se de um crime de ódio: Zeltner era gay, e isso incomodava Dale. Já Shawn Antilla, um amigo de Dale à época, disse que o fato de Zeltner ser gay não foi o motivo do crime, mas que certamente havia facilitado o assassinato. Para Shawn, Dale demonstrava não gostar de gays.

 

O verdadeiro motivo do assassinato de Zeltner

Foto da vítima Zeltner em Sou Um Assassino Em Liberdade

 

No último episódio de Sou Um Assassino: Em Liberdade, descobrimos a real motivação de Dale para o assassinato de Zeltner. Dale Sigler afirma que era amigo de Zeltner, e que uma vez ao dormir em sua casa, Zeltner havia tentado seduzi-lo. Quando Dale se recusou a fazer sexo, Zeltner teria chantageado o colega, falando que contaria para todo mundo que eles haviam transado se Dale não cedesse às investidas.

Revoltado e não tendo mais nada a perder a não ser sua reputação, Dale foi ao Subway em que Zeltner trabalhava exclusivamente para matá-lo. O roubo foi uma maneira apenas de encobertar o crime.

Para o promotor do caso Greg Miller, a nova revelação de Dale é uma forma de o assassino se vitimizar, enquanto “vilaniza” sua própria vítima. Se Zeltner realmente tentou abusar de Dale, ele não deveria ter ido à polícia em vez de assassinar o amigo?

Um dos momentos mais desconcertantes do documentário é quando Dale confessa que poderia ser um assassino, mas que ele nunca, jamais, foi gay.

O que leva uma pessoa a acreditar que ser gay é um crime mais julgável e reprovável do que ser um assassino? Na prisão, Dale se tornou pastor e demonstra arrependimento pelo crime que cometeu. Mas mesmo após todas essas décadas, ainda lhe parece impensável que alguém o tenha confundido com um homossexual.

Ao ser questionado pelos produtores da série, Dale afirma que não é homofóbico. Ele acrescenta que de acordo com a Bíblia, a homossexualidade é uma abominação, mas que não caberia a ele julgar as pessoas.

Após o abuso sofrido na infância, ele diz que passou por um momento turbulento e confuso sobre sua própria sexualidade. De acordo com ele, isso pode ter contribuído para a violência cometida contra alguém que iria manchar sua reputação como homem heterossexual.

O crime de ódio cometido contra Zeltner na verdade representa uma violência contra o que o próprio Dale temia ser.

A masculinidade tóxica e o abuso sofrido por Dale na infância foram o combustível de sua homofobia que culminou no assassinato de Zeltner. Porque ainda que o motivo do crime não tenha sido a homossexualidade de Zeltner, foi a manutenção de sua honra como homem heterossexual que fez Dale puxar o gatilho. Seis vezes.

 

Há muitas questões abordadas em Sou Um Assassino: Em Liberdade. Assassinos merecem uma segunda chance? Se a ressocialização é possível, a pena de morte deveria existir? O que contribui em nossa sociedade para a crença de que a homossexualidade é uma ofensa punível com a pena capital?

Sobre a pena de morte, o próprio promotor do caso responde no documentário: “Qual a punição justa para homicídios? Vou te dizer que é uma pergunta muito difícil de responder. Acho que a pena que ele recebeu neste caso foi justa. Digam o que for, 30 anos na cadeia é muito tempo.”

Você gostou de Sou Um Assassino: Em Liberdade? O que achou da grande revelação sobre a motivação do crime? Deixe nos comentários!

 

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Boo Mesquita

Geek de carteirinha e cinéfila, ama assistir a filmes e séries, ir a shows, ler livros e jogar, sejam games no ps4 ou boards. Quando não está escrevendo, pode ser vista fazendo pole dance, comendo fora ou brincando com cachorrinhos. Me siga no Instagram!

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